eles virão buscar-vos brevemente...

sexta-feira, 15 de abril de 2011

sempre ao longe 04/2011

Era uma rapariga. Via-a ocasionalmente quando passava por mim; quando era pequeno, ainda lhe acenei uma ou outra vez, mas ela não ligava. Era difícil ter uma relação por muito mínima que seja com alguém que está sempre a correr. Era tudo o que ela fazia. Não a via comer, dormir, parar sequer. Suponho que ela fazia tudo isso, mas no primeiro dia em que resolvi segui-la nem isso consegui ver e como a minha mãe iria ficar preocupada caso não chegasse a tempo de jantar, desisti. Era uma rapariga bonita. Eu via os rapazes a olhar para ela. Tinha ciúmes, claro, mas sabia que nenhum deles a queria verdadeiramente; e mesmo que quisessem, não me parece que conseguissem impor a sua vontade para que ela deixasse de correr. E quem quer uma mulher que esteja sempre a correr? Uns anos mais tarde, quando já conduzia, resolvi seguir a mulher. Tentei falar com ela, mas também não me respondeu. Resolvi parar o carro e correr ao seu lado. Disse-me olá, como se apenas me tivesse visto agora. Não consegui parar de olhar para o seu sorriso. E depois apercebi-me de que nunca a tinha visto sem ser a sorrir. O único sorriso verdadeiro que vi em alguém. Perguntei-lhe porque é que corria, porque é que não parava um pouco. Porque ao correr estava feliz; se parasse não estava, portanto só quando estivesse sem forças é que pararia. Depois perguntei porque é que isso a punha feliz. Ela respondeu apenas que o sítio onde se está nos esgota, a felicidade está sempre à nossa frente, e por isso ela corria para ela. Numa última pergunta, quis saber porque é que se a felicidade está sempre na ida, porque é que ela ficava nestes anos todos sempre perto de casa. Ela olhou para mim e disse que estava à espera que alguém a acompanhasse. Fiquei sem forças e tive de parar; ela continuou. Nunca mais a vi, desde então, mas tenho corrido todos os dias para ganhar forças para ir atrás.

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